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Editorial da AFPF*

Segundo o Código Penal brasileiro, o art. 171 trata o estelionato como crime contra o patrimônio, sendo este definido como “obter, para si ou para outro, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”.

Segundo os juristas, para que exista o delito de estelionato, faz-se mister a existência dos quatro requisitos citados acima: obter vantagem, causar prejuízo a outrem; utilizar ardil e induzir alguém a erro. Vejamos se o artigo 171 pode aplicar-se à renovação das antigas concessões ferroviárias por mais 30 anos:

I - Quem leva vantagem? As atuais concessionárias, que vão ganhar de presente do governo federal mais 30 anos de concessão sem que se dê a chance de entrada de novos operadores ferroviários para estimular a concorrência; em outras palavras, é mais do mesmo.

II - Quem fica com o prejuízo? O povo brasileiro, que bancou a construção das ferrovias com o pagamento de impostos e hoje em nada se beneficia desse modelo, pois não existem mais trens de passageiros.

As atuais concessionárias somente transportam cargas de exclusivo interesse dos seus acionistas, em trechos de alta rentabilidade (corredores de exportação): o minério de ferro responde 80% do total transportado, seguido por produtos siderúrgicos, soja, milho, contêineres e outras cargas de menor valor agregado. Por conta dessa exclusividade, a carga geral que existe em todo lugar no Brasil e que podia estar sendo transportada pela ferrovia, segue por via rodoviária. Reflita: qualquer objeto que esteja na sua casa, na sua loja ou na sua mão, veio de caminhão.

III - Qual é o maior erro? A concessão de 28 mil km da malha ferroviária se deu nos anos 1996/7.

A agência reguladora (ANTT) foi somente criada em 2001, e a extinção da RFFSA (Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima) se deu em 2007, mas foi somente em 2013 que se definiram as responsabilidades para com o seu patrimônio: o material operacional ficou com as concessionárias, o não operacional com o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e os bens de valor histórico com o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Tarde demais! Durante muito tempo, havia muitos direitos, mas poucas obrigações das concessionárias para com o acervo da RFFSA que não lhes interessava. Assim, milhares de estações foram esquecidas, milhares de vagões de carga sucateados, 12 mil km de vias férreas abandonadas, bem como centenas de locomotivas, carros de passageiros, oficinas, instalações etc.. Tudo isso vai ser perdoado?

IV - Qual é o ardil? Para escaparem das multas indenizatórias, as concessionárias prometem ao governo realizarem novos investimentos - que seriam responsabilidade do Governo - aplicando o valor desta, em outros locais, do seu inteiro interesse; ou seja, o patrimônio do povo brasileiro que foi mal cuidado e abandonado pelas concessionárias, assim permanecerão e ficarão à disposição dos amigos do alheio e sucateiros, que vão vender os trilhos e dormentes usados. Alguns outros trechos serão entregues para prefeituras interessadas em desmontar a malha ferroviária e transformá-las em estradas vicinais ou ciclovias.

Isso tudo está regulado na medida Provisória 752/2016, que foi transformada na Lei 13.448/17, que trata das prorrogações.

Em suma, estelionato é crime de resultado para os que querem obter vantagem (ilícita), causando prejuízo a outrem. Caso este prejuízo vise à pessoa indeterminada, está caracterizado, segundo a Lei, crime à economia popular que, em última instância, é o coitado do Povo Brasileiro. Que 2018 dê um pouco de luz aos (in)decisores públicos e privados. Oremos, pois, e muito!

* Publicado no boletim informativo da Associação Fluminense de Preservação Ferroviária, nº 171

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