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Já existem diversos exemplos de produção de alimentos em larga escala a partir da agricultura orgânica no Brasil. Os debates em torno do Projeto de Lei 6670/2016, que institui a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA), têm evidenciado experiências de produção sustentável em diversos contextos: assentamentos rurais, pequenas, médias e grandes propriedades, além de grandes indústrias.

Produção agroecológica cresce no PaísEsta semana aconteceram duas audiências públicas na Câmara dos Deputados, em Brasília (7 e 8/8), e um seminário em São Paulo (9/8) para discutir a PNARA. Nos três debates ficou claro que o argumento comumente apresentado pela bancada ruralista, de que é impossível alimentar a população sem o aumento do uso de agrotóxicos, não corresponde à realidade.

Segundo Roberto Carneiro, presidente da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF), o modelo de agricultura altamente dependente de insumos químicos deve ser superado. “Precisamos buscar processos produtivos pensando-se no solo, em cultivares mais resistentes e em sistemas mais diversificados, em que os processos ecológicos entre predadores e pragas possa acontecer naturalmente”, afirmou.

Roberto Carneiro lembrou que, para esta transição acontecer, é fundamental prover ao agricultor assistência técnica pública voltada para a produção agroecológica, gerando um processo gradual de mudança nas propriedades rurais. “Aqui no DF, a produtividade média do morango orgânico já é maior que a da produção convencional. Estamos falando da produção de frutas sem uma gota de agrotóxicos, com altíssima produtividade”, exemplificou.

A representante da Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo, Araci Kamiyama, destacou que, dos 645 municípios paulistas, 257 (40%) têm projetos de agricultura orgânica. Já são mais de 2 mil unidades produtoras em todo o estado. “Temos que sair do modelo da monocultura, que causa erosão, contaminação de alimentos e outros danos, e passar para o manejo ecológico de pragas e doenças”, opinou.

Araci Kamiyama destacou a importância da PNARA, que propõe incentivos fiscais e acesso ao crédito barato para produção de alimentos orgânicos. “O modelo atual tornou-se dominante de forma intencional, com muito incentivo e vontade política”, lembrou.

Outro importante caso de sucesso, que demonstra a viabilidade econômica da produção de alimentos orgânicos, foi descrito por Fátima Cabral, presidente da Associação de Produtores Agroecológicos Alto São Bartolomeu (Aprospera). A entidade tem 45 associados e fornece mais de 40 variedades de alimentos sem agrotóxicos a cerca de 500 famílias no Distrito Federal, por meio de sistemas agroflorestais (SAFs) que conservam matas e rios da região.

Os produtores são remunerados no sistema denominado Comunidades que Sustentam a Agricultura, um modelo que surgiu nos EUA e no Canadá nos anos 1980, em que cidadãos adquirem alimentos diretamente com os agricultores. Isso elimina os atravessadores, que via de regra achatam os ganhos de quem produz e aumentam o preço para o consumidor.

“Com a CSA, o cidadão financia a agricultura limpa e sustentável, mantendo o agricultor na terra sem contaminar o solo, a água e o ar. Na medida em que isso ganha escala, cada vez mais pessoas vão se alimentar melhor e se desintoxicar. Não se trata de uma proposta de algo que ainda pode acontecer. É presente, é atual, é real”, relatou Fátima Cabral.

O WWF-Brasil apoiou em 2016 a criação da Aprospera e é parceiro da associação na criação de CSAs e na busca de parceiros. De acordo com Vinícius Pereira, analista de conservação do programa Cerrado Pantanal do WWF-Brasil, a agroecologia e as CSAs são um importante contraponto real ao modelo de produção dominante.

“São iniciativas que promovem a reconexão entro campo e a cidade, aproximando as pessoas da terra e do alimento. Temos um alimento que traz consigo os conceitos de economia solidária, reforma agrária, agricultura familiar, alimentação saudável, saúde, nutrição e conservação ambiental”, observou Vinícius Pereira.

Também na cafeicultura a produção orgânica em grande escala já é uma realidade. Cássio Franco Moreira, secretário-executivo da Associação dos Cafés Orgânicos e Sustentáveis do Brasil (ACOB), salientou algumas vantagens da produção orgânica. “Muitos mercados internacionais que compram café do Brasil, como Japão e União Europeia, têm níveis altíssimos de exigência em relação a resíduos de agrotóxicos nos grãos. O Brasil deixa de atingir muitos desses mercados devido à contaminação”, relatou.

Cássio Franco Moreira mostrou diversas propriedades apoiadas pela ACOB, nas quais o café é produzido com adubações orgânicas e controle biológico de pragas e doenças, tanto em assentamentos de reforma agrária, como por pequenos, médios e grandes produtores, com excelentes resultados. “Não é porque é orgânico que não pode ser em larga escala, mecanizada e eficiente”, acrescentou.

O modelo de produção orgânica também tem se mostrado economicamente viável para grandes indústrias. É o caso da Native, sediada no município de Sertãozinho, em São Paulo. Com 6 mil funcionários e seis empresas, o grupo produz 100 mil toneladas de produtos orgânicos para o Brasil e mais 60 países, a partir de 22 mil hectares de áreas certificadas.

Fernando Alonso, gerente de desenvolvimento agronômico da Native, explicou o funcionamento das lavouras e usinas de cana-de-açúcar orgânica do grupo, relatando a altíssima produtividade do modelo. Adicionalmente, relatou os impactos socioambientais da produção, como aumento do número de espécies de fauna, inclusive algumas ameaçadas de extinção, e da conservação de nascentes e rios na região, beneficiando inúmeras comunidades.

“Para nós, torna-se cada dia mais evidente que o sistema orgânico é mais produtivo que o convencional, inclusive quando comparamos os mesmos tipos de solo.  Estamos produzindo mais cana e mais água. Estamos mitigando emissões de carbono. É possível produzir muito bem sem uso de agrotóxicos e de fertilizantes químicos sintéticos”, finalizou Fernando Alonso.

O PL 6670/2016, que institui a Política Nacional de Redução dos Agrotóxicos, está em análise na Câmara por uma comissão especial, presidida pelo deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) e sob relatoria do deputado Nilto Tatto (PT-SP). Segundo Tatto, é fundamental inverter a lógica que elevou a monocultura com uso intensivo de agrotóxicos à condição de modelo dominante no país. “A cadeia do agrotóxico recebeu R$ 9 bilhões de isenções fiscais nos últimos sete anos. É preciso deslocar parte desses incentivos para a agricultura orgânica e sustentável”, defendeu o parlamentar.

WWF Brasil

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