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O número de consumidores que geram sua própria energia a partir de fontes renováveis e injetam na rede elétrica central do País dobrou nos últimos meses. De 2.737 unidades em março, saltou para 6.017 em outubro. Desse total, 5.929 são formadas por painéis fotovoltaicos que captam energia solar.

Apesar de ainda ser uma quantidade inexpressiva, diante das 80 milhões de unidades consumidoras existentes, especialistas ouvidos afirmam que o mercado está aquecido, há novas linhas de financiamento e, com isso, novos empreendedores devem surgir. Conforme estimativa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), as chamadas micro e minigeração de energia distribuída devem chegar a 1,2 milhão de unidades consumidoras no Brasil até 2024.

O crescimento coincide com o período em que entrou em vigor a Resolução Normativa (REN) 687, publicada em novembro de 2015 pela Aneel, e que passou a valer em 1º de março último. A REN, resultado de consulta pública realizada entre maio e junho do ano passado, é uma revisão da REN nº 482 de 2012, que criou e regulamentou a geração desse tipo de energia. A iniciativa reduz o valor da conta de luz. Outro fator positivo é a isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) em quase todo o País, para quem gerar energia dessa forma. Somente Amapá, Amazonas, Espírito Santo, Paraná e Santa Catarina ainda não aderiram.

Para Thereza Neumann dos Santos Freitas, diretora da FNE, entidades do setor têm tido papel preponderante nas discussões e busca de mudanças de paradigmas. “As isenções de impostos, financiamentos, capacitação de profissionais e empresas, certificação de cursos e mão de obra são temas em plena evolução e de iniciativa das entidades”, afirma a engenheira.

Novos modelos

A revisão da norma criou novos mecanismos de compensação de energia: geração condominial, que abrange as residências e a área coletiva do condomínio; autoconsumo remoto, em que um mesmo titular pode utilizar a energia gerada excedente em outro endereço, desde que esteja na mesma área de concessão.

No entanto, a novidade que mais está chamando a atenção é a geração compartilhada, em que um conjunto de consumidores (pessoas físicas ou jurídicas) se reúne em um consórcio ou cooperativa. “É uma revolução. Ao invés de cada um investir na aquisição de sistemas individuais, com preço mais elevado, eles investem juntos em um grande sistema e ganham em escala. Cada um se torna proprietário de uma fração e quando a energia é gerada, ela é distribuída proporcionalmente”, explica Rodrigo Sauaia, presidente executivo da Associação Brasileira de Energia Fotovoltaica (Absolar).

Ele conta ainda que a geração compartilhada pode seguir diversos modelos, nos quais os clientes podem alugar ou adquirir um lote e pagá-lo em um contrato de longo prazo, com parcelas que caibam em seus custos. Ou pode ser um único cliente, com diversos endereços consumidores, que tenha contratado uma empresa especializada. É o caso da rede de farmácias Pague Menos, no Ceará, que contratou a empresa Enel para erguer e manter o primeiro condomínio solar do País em geração distribuída, na cidade de Tabuleiro do Norte. São 3.420 placas fotovoltaicas, instaladas em uma área de 35 mil metros quadrados, com potência total para abastecer cerca de 900 residências diariamente. O valor total do investimento foi de R$ 7 milhões para atender 40 lojas da rede. A empresa geradora estima que serão entregues 1.750 megawatts/hora (MWh) por ano, representando uma economia de 8% por mês na conta.

Segundo Jurandir Picanço, consultor de energia na Federação das Indústrias do Ceará e presidente da Câmara Setorial de Energias Renováveis daquele estado, diante do panorama atual com tarifas em alta, diversos empresários estão planejando entrar nesse segmento. “Quanto mais alta a tarifa da concessionária, melhor para as empresas que vendem geração distribuída, porque a possibilidade de retorno é muito maior. Vemos isso em Minas Gerais, onde a tarifa é mais alta, e é justamente onde ocorre um avanço maior”, conta.

Outras melhorias importantes foram o aumento da potência permitida, de três para cinco megawatts; a instituição de formulários padrão para solicitação de acesso pelo consumidor; redução do prazo total, de 82 dias para 34, para a distribuidora conectar usinas de até 75kW; e ampliação do prazo para utilizar o crédito excedente, de 36 para 60 meses.

Recursos para investir

Para ampliar a oferta de financiamento, um dos gargalos para a expansão desses modelos de negócio, a Absolar, em cooperação com a atual Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, e a Associação Brasileira de Energia Eólica (AbeEólica) lançaram, no final de 2015, uma linha, via Programa Nacional da Agricultura Familiar (Pronaf), para pequenos produtores rurais e assentados da reforma agrária. O financiamento pode ser obtido por pessoa física, cadastrada no Pronaf. As taxas variam de 2,5% a 5,5% ao ano.

Outra linha lançada em maio deste ano é o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste, o FNE Sol do Banco do Nordeste, para pessoa jurídica, disponível também no norte de Minas Gerais e norte do Espírito Santo, com prazo de 12 anos, até um ano de carência e taxas que variam entre 6,5% e 12,95%, ao ano.   “Esse financiamento foi muito celebrado pelo setor, porque indica um caminho que pode ser seguido em outras regiões do País”, diz Sauaia, que reconhece que os bancos públicos ainda deixam a desejar no fomento de investimentos para pessoa física. Alguns bancos privados já se arriscam, como o Santander, com taxas que variam de 2,95% a 2,39% ao mês.