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Haverá falta de profissionais, alerta a Ordem dos Engenheiros e as empresas de construção (Foto: FERNANDO VELUDO/NFACTOS)

Metade das vagas disponíveis nos cursos de Engenharia Civil ficaram vazias no final das duas primeiras fases do concurso de acesso ao ensino superior deste ano. A tendência já vinha do ano passado, mas agudizou-se e, caso esta quebra da procura continue nos próximos anos, terá consequências para o sector da construção. A Ordem dos Engenheiros (OE) e as empresas do sector concordam em afirmar que Portugal vai ter falta de profissionais da área já dentro de cinco a seis anos. Se assim for, o país será forçado a passar de exportador e importador destes técnicos.

Há quatro anos, havia 800 candidatos aos cursos de Engenharia Civil. Neste momento, o número de colocados não chega a metade – pouco mais 300 até ao momento. “Não é difícil de antecipar que vamos ter um défice de engenheiros”, defende o bastonário da OE, Carlos Matias Ramos. “Um número como este não chega sequer para compensar as pessoas que vão para a reforma”, sublinha o director do curso de Engenharia Civil da Universidade do Minho, Jorge Pais.

A avaliação da Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (Aiccopn) é semelhante. “Vamos ter consequências a médio prazo”, alerta o presidente, Reis Campos. E à quebra do número de engenheiros que sairão das escolas nacionais nos próximos acrescenta uma outra dimensão neste problema “preocupante”: a crescente procura de engenheiros portugueses por parte de empresas estrangeiras. “São décadas de acumulação de conhecimentos científicos, de know-how, de experiência, que não podem ser desmantelados, por força de uma diminuição da procura de cursos de ensino superior”, sustenta.

Nos cursos desta área nas universidades públicas ainda há dois terços das vagas por preencher. Na terceira fase, que terminou na semana passada, os estudantes ainda tinham 816 vagas disponíveis em licenciaturas e mestrados integrados de Engenharia Civil. Só 11 alunos foram colocados.

No início do concurso nacional havia 1100 vagas em 20 cursos. No final do processo, 553 ficaram por preencher. A grande maioria dos novos alunos foi apenas para duas instituições: as universidades do Porto (108 colocados) e Lisboa (125), que foram as únicas que ficaram próximas de preencher a totalidade de vagas disponíveis.

De resto, há dez formações na área – entre os quais as do Instituto Politécnico de Bragança e Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro – que não tiveram um único aluno colocado nas duas primeiras fases. As universidades do Algarve e da Beira Interior e o Instituto Politécnico do Porto viram apenas um estudante entrar nos seus cursos de Engenharia Civil.

A tendência é transversal a todas as áreas de engenharia que, de acordo com a Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES), abriram 9022 vagas este ano (o mesmo número do ano passado), mas a taxa de ocupação desceu de 62% para os 59%. A Engenharia Civil foi, porém, atingida com maior intensidade. E, pelo segundo ano consecutivo, uma vez que no ano passado já se tinha verificado uma quebra da procura.

O impacto negativo desta realidade para o mercado da construção vai sentir-se “dentro de cinco a seis anos”, precisamente quando estes estudantes que agora chegam ao ensino superior estiverem a terminar a sua formação. A previsão é do presidente da Secção Regional do Norte da OE, Fernando Almeida Santos, e é partilhada pelos administradores das empresas de construção ouvidos pelo PÚBLICO.

 “Faltarão recursos no nosso país. A partir do momento em que isso acontecer, vai ser preciso recorrer ao mercado internacional”, antecipa António Carlos Rodrigues, da Casais. “Quando o mercado começar a pedir engenheiros, não vamos ter tempo de os formar”, acrescenta José Teixeira, CEO da DST. Em menos de uma década, as empresas “estarão a pagar mais caro pelos seus engenheiros” e os melhores alunos “vão ser disputados” pelas construtoras, defende o mesmo empresário.

“Em termos de rejuvenescimento e renovação desta família profissional, a manutenção desta tendência, a médio prazo, poderá vir a constituir um problema que venha a carecer de medidas direccionadas”, defende também fonte da Direcção Corporativa de Recursos Humanos da Mota-Engil.

A Mota-Engil lembra igualmente que a saída de engenheiros civis do país – cerca de 2000 nos últimos três anos – “não é apenas uma consequência natural da internacionalização” das empresas nacionais, mas também fruto da falta de oportunidades internas. “É algo que naturalmente tem de ser ponderado e que poderá constituir uma dificuldade no futuro, se se perpetuar demasiadamente no tempo”, acrescenta a mesma fonte.

Entre as construtoras, a única que não alinha por esta perspectiva, partilhada pela Ordem e pela Aiccopn, é a Soares da Costa. “Tomando em consideração a evolução recente e esperada a curto/médio prazo do mercado de construção civil e infra-estruturas, essas expectativas mais negativas [de alunos] são, em nosso entender, justificadas”, afirma fonte da administração.

Fonte: noticia-portugal_pode_ter_de_importar_engenheiros_civis_dentro_de_cinco_a_seis_anos-143852_17102014

Autor: Samuel Silva / Publico Portugal