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Por: Edésio Passos*

Transcorridos vinte e quatro anos da fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e da formação de mais uma dezena de novas entidades com características semelhantes, foi encaminhado projeto de lei à Câmara dos Deputados que reconhece formalmente as centrais sindicais e altera dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho relativos à contribuição sindical obrigatória dos trabalhadores e empregadores (PL 1.990/2007).

Somente após acordo entre as principais centrais sindicais existentes (CUT, Força Sindical, Nova Central Sindical dos Trabalhadores, União Geral dos Trabalhadores), foi possível o encaminhamento do projeto de lei, com caráter de urgência constitucional, prazo de 45 dias para ser votado no plenário da Câmara dos Deputados. Em seguida, seguirá ao Senado Federal.

Esse período possibilitará que as atuais centrais sindicais regularizem sua condição associativa visando o reconhecimento após a aprovação do projeto de lei. O Governo federal e as Centrais Sindicais constituídas optaram pelo projeto de lei em caráter de urgência constitucional, afastando as hipóteses de medida provisória ou emenda constitucional. No caso de não optar pela emenda constitucional, significa que o sistema constitucional de unicidade sindical se mantém sem alterações.

Atribuições, prerrogativas e definição

O artigo primeiro estabelece que “a central sindical, entidade de representação geral dos trabalhadores, constituída em âmbito nacional, terá as seguintes atribuições e prerrogativas: I–exercer a representação dos trabalhadores, por meio das organizações sindicais a ela filiadas; e II – participar de negociações em fóruns, colegiados de órgãos públicos e demais espaços de diálogo social que possuam composição tripartite, nos quais estejam em discussão assuntos de interesse geral dos trabalhadores”.

No parágrafo único do artigo 1º está a definição da natureza da entidade: “Considera-se central sindical, para os efeitos do disposto nesta Lei, a entidade associativa de direito privado composta por organizações sindicais de trabalhadores”. Está evidenciado o caráter pluralista e específico, ou seja, da composição exclusiva por organizações sindicais de trabalhadores de todas as categorias profissionais, mas impedindo a filiação de organizações não-sindicais.

Requisitos para constituição

São requisitos para a constituição da entidade, como está fixado no artigo 2º: “I – filiação de, no mínimo, cem sindicatos distribuídos nas cinco regiões do País; II – filiação em pelo menos três regiões do País de, no mínimo, vinte sindicatos em cada uma; III – filiação de sindicatos em, no mínimo, cinco setores de atividade econômica; e IV – filiação de trabalhadores aos sindicatos integrantes de sua estrutura organizativa de, no mínimo, sete por cento do total de empregados sindicalizados em âmbito nacional”.

Esclarece o projeto de lei, no parágrafo 1º, que “o índice previsto no inciso IV será de cinco por cento do total de empregados sindicalizados em âmbito nacional no período de vinte e quatro meses a contar da publicação desta Lei” e, no parágrafo 2º, que “as centrais sindicais que atenderem apenas aos requisitos dos incisos I, II e III poderão somar os índices de sindicalização dos sindicatos a elas filiadas, de modo a cumprir o requisito do inciso IV”.

Representatividade

O artigo 3º trata da “indicação pela central sindical de representantes nos fóruns tripartites, conselhos e colegiados de órgãos públicos a que se refere o inciso II do art. 1º” e que “será em número proporcional ao índice de representatividade previsto no inciso IV do art. 2º, salvo acordo entre centrais sindicais”.

Entretanto, no parágrafo único está determinado que “o critério de proporcionalidade, bem como a possibilidade de acordo entre as centrais, previsto no caput, não poderá prejudicar a participação de outras centrais sindicais que atenderem aos requisitos estabelecidos no art. 2º”.

E no artigo 4º, complementado de que “a aferição dos requisitos de representatividade de que trata o art. 2º será realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego” e, ainda, no parágrafo 1º, que “o Ministro de Estado do Trabalho e Emprego, mediante consulta às centrais sindicais, poderá baixar instruções para disciplinar os procedimentos necessários à aferição dos requisitos de representatividade, bem como para alterá-los com base na análise dos índices de sindicalização dos sindicatos filiados às centrais sindicais”, assim como, no parágrafo 2º, “ato do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego divulgará, anualmente, relação das centrais sindicais que atendem aos requisitos de que trata o art. 2º, indicando seus índices de representatividade”.

Contribuição sindical

O artigo 5º altera os artigos 589, 590, 591 e 593 da CLT, que passam a vigorar com a seguinte redação: Art. 589 - I – para os empregadores: a) 5% (cinco por cento) para a confederação correspondente; b) 15% (quinze por cento) para a federação; c) 60% (sessenta por cento) para o sindicato respectivo; e d) 20% (vinte por cento) para a “Conta Especial Emprego e Salário”; II – para os trabalhadores: a) 5% (cinco por cento) para a confederação correspondente; b) 10% (dez por cento) para a central sindical; c) 15% (quinze por cento) para a federação; d) 60% (sessenta por cento) para o sindicato respectivo; e d) 10% (dez por cento) para a “Conta Especial Emprego e Salário”. Ou seja, na disposição legal anterior a Conta Especial Emprego e Salário, do governo federal, que recebia 20% do montante arrecadado, restando agora com 10%, destinados a ser dividido entre as Centrais Sindicais.

Indicação da central

Os parágrafos do artigo 5º instruem sobre a indicação da Central: o parágrafo 1º orienta que “o sindicato indicará ao Ministério do Trabalho e Emprego a federação e confederação a que estiver vinculado e, no caso dos trabalhadores, a central sindical a que estiver filiado, como beneficiários da respectiva contribuição sindical, para fins de destinação dos créditos previstos neste artigo”; e o parágrafo 2º “a central sindical a que se refere a alínea “b” do inciso II deste artigo deverá atender aos requisitos de representatividade previstos na legislação específica sobre a matéria”. Portanto, a indicação da Central Sindical pelo sindicato está condicionada a que a mesma esteja devidamente reconhecida pelo Ministério do Trabalho e Emprego ou por determinação judicial.

Outras orientações

Os demais artigos da CLT sobre a contribuição sindical passam a ter a seguinte redação: (1) “Art. 590. Não havendo indicação de entidades sindicais de grau superior ou de central sindical, na forma do §1º do art. 589, os percentuais que lhes caberiam serão destinados à “Conta Especial Emprego e Salário”. Parágrafo único. Não havendo sindicato, nem entidade sindical de grau superior ou central sindical, a contribuição sindical será creditada, integralmente, à “Conta Especial Emprego e Salário”.

(2) “Art. 591. Inexistindo sindicato, o percentual previsto na alínea “c” do inciso I e na alínea “d” do inciso II do art. 589 será creditada à federação correspondente à mesma categoria econômica ou profissional. Parágrafo único. Na hipótese do caput, os percentuais previstos nas alíneas “a” e “b” do inciso I e nas alíneas “a” e “c” do inciso II do art. 589 caberão à confederação”.

(3) “Art. 592. As percentagens atribuídas às entidades sindicais de grau superior e às centrais sindicais serão aplicadas de conformidade com o que dispuserem os respectivos conselhos de representantes ou estatutos. Parágrafo único. Os recursos destinados às centrais sindicais deverão ser utilizados no custeio das atividades de representação geral dos trabalhadores decorrentes de suas atribuições legais”.

Registro no MTE

As centrais sindicais deverão ser inicialmente registradas no cartório de registro de pessoas jurídicas, face sua condição de direito privado. Embora não se encontre no projeto de lei qualquer dispositivo que, explicitamente, determine o registro da central sindical no Ministério do Trabalho, o controle oficial está determinado no artigo 4º do projeto de lei no sentido de que “a aferição dos requisitos de representatividade... será realizada pelo MTE”, assim como face as instruções ministeriais a respeito dessa aferição, além de, anualmente, divulgar “a relação das centrais sindicais que atendem aos requisitos de que trata o artigo 2º, indicando seus índices de representatividade”. Ademais, para a central sindical receber a contribuição sindical “deverá atender aos requisitos de representatividade”.

Como o recebimento da contribuição sindical depende de código fornecido pelo Ministério do Trabalho e Emprego, resulta que, necessariamente, a central sindical deverá submeter ao Ministério do Trabalho seu pedido de registro ou reconhecimento, fixada, deste modo, a normatividade sobre tal registro ou reconhecimento, ao sabor do Ministro do Trabalho e Emprego, na forma das referidas instruções sobre a aferição da representatividade. Provavelmente, em tais instruções serão estabelecidas as regras para o registro ou reconhecimento, inclusive o direito a impugnação.

Consolidação do sistema sindical

O projeto de lei consolida o atual sistema da unicidade sindical, eis que, entre outros fatores:

(1) mantém o sistema constitucional de sindicato, federação e confederação;

(2) inclui, no topo do sistema, a central sindical;

(3) mantém o sistema de controle sindical pelo Ministério do Trabalho e Emprego;

(4) consolida o atual sistema da contribuição sindical em favor das entidades sindicais de empregados e empregadores, de caráter compulsório, a todos os trabalhadores;

(5) os trabalhadores passam a ter representação oficial nos fóruns, colegiados de órgãos públicos e demais espaços de diálogo social que possuam composição tripartite, nos quais estejam em discussão assunto de interesse geral dos trabalhadores (governo, empregadores, empregados).

Na medida em que o trabalhador contribuirá diretamente para a central sindical, via sua contribuição sindical anual, terá direito a ter conhecimento da atuação da nova entidade de cúpula, à qual o sindicato pelo qual é representado é filiado.

Sistema de representação

O exercício do sistema de representação da central sindical se verificará “por meio das organizações sindicais a ela filiadas”. Isto significa que, no caso das negociações coletivas de trabalho, será possível que a central sindical, juntamente com os sindicatos a ela filiados e por determinação da assembléia geral desses sindicatos, possa receber poderes de negociação, como hoje, aliás, já recebem as federações e confederações de trabalhadores.

Essa possibilidade abre campo para o contrato coletivo de trabalho intersindical de âmbito nacional formatado através da representação sindical integrada na central sindical. No que concerne à representação em juízo, através de decisão de assembléia geral do sindicato, poderá a central sindical co-participar de ações coletivas, nos casos que a lei especificar.

Quanto à representação perante o Supremo Tribunal Federal, dependerá de emenda constitucional, pois via projeto de lei não será possível agregar essa condição, hoje exclusiva das confederações.

Filiação e composição

Outro ponto em aberto no projeto de lei refere-se à filiação do sindicato à central sindical. Em princípio, essa decisão caberá a assembléia geral convocada com esta finalidade, caso o estatuto social não determine em contrário.

No que concerne à composição das direções das centrais sindicais, poderá ser livremente constituída, mas o projeto de lei não esclarece se apenas os dirigentes das entidades filiadas é que poderão ser eleitos, ou se também trabalhadores sem mandato em determinado sindicato de base, ficando esta matéria a ser definida no próprio estatuto da central.

Também não está vedada, mas não é explicitada, a filiação de federações e confederações na central, pois o projeto de lei refere-se a apenas sindicatos na formação da entidade. Mas tendo em vista que a central é composta de organizações sindicais, poderá as federações e confederações a ele estar filiadas.

Centrais não reconhecidas

É possível a existência de centrais sindicais não reconhecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Atuarão livremente, mas sem a possibilidade de representação nos organismos tripartites do governo, não receberão a contribuição sindical, nem poderão se fazer representar por decisão das entidades sindicais filiadas. Atuarão como entidades de direito privado, registradas em cartório, como integrantes do movimento social.

Emenda: indicação apenas da Central Sindical

Em reunião realizada em 19 de setembro, a Coordenação das Federações de Trabalhadores do Paraná aprovou o apoio à emenda elaborada pelo presidente da Federação dos Empregados no Comércio do Estado do Paraná, Vicente Silva, e assinada e apresentada ao relator do projeto de lei pelo deputado Darcísio Perondi, vice-líder do PMDB, para modificação do referido parágrafo.

A emenda [nº 5] apresentada ao § 1º do artigo 589 do projeto de lei, que dispõe sobre o reconhecimento das centrais sindicais, passa a ter a seguinte redação: “§ 1º - O sindicato profissional indicará a central sindical a que estiver filiado, como beneficiária da respectiva contribuição sindical, para fins de destinação dos créditos previstos neste artigo”.

Segundo a justificativa da emenda, a indicação pelo sindicato de base ao Ministério do Trabalho de qual federação e confederação está vinculado para efeito do crédito da contribuição sindical é completamente desnecessária e temerária. Desnecessária, pois o “caput” do próprio artigo 589 da CLT define que da importância da arrecadação da contribuição sindical serão feitos os respectivos créditos pela Caixa Econômica Federal, nos percentuais correspondentes a cada entidade da categoria profissional ou econômica e a “conta especial emprego e salário”.

O crédito dos percentuais da contribuição sindical para a federação e confederação de trabalhadores sempre foi feito de forma automática com base na vinculação entre as entidades integrantes da respectiva categoria profissional, sendo desnecessária a indicação pelo sindicato de qual federação ou confederação está vinculado. A vinculação vertical dentro da categoria profissional ou econômica é compulsória.

Temerária, pois a) concede poder ao Ministério do Trabalho para interferir no patrimônio das entidades sindicais; b) a norma legal poderá ensejar a proliferação de federações e confederações da mesma categoria, ferindo o princípio da unicidade sindical; c) desrespeita completamente o conceito de categoria profissional ou econômica, pois o texto proposto faculta ao sindicato escolher a federação ou confederação a ser beneficiada com a contribuição sindical. Exemplo: um sindicato dos trabalhadores na indústria da construção civil poderá indicar como vinculado à federação dos empregados em estabelecimentos bancários. Imaginem o caos que se estabeleceria na organização sindical do nosso País.

Outras Emendas

Além da emenda referente ao parágrafo 1º do art. 589 da CLT, mais quinze emendas foram apresentadas, entre outras destacamos:

(1) Os servidores públicos federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal poderão constituir central sindical;

(2) Às entidades sindicais de trabalhadores não filiadas a uma central sindical é assegurada a participação nas negociações (em fóruns, colegiados de órgãos públicos) na medida e na proporção da sua representatividade;

(3) O estatuto da central sindical estabelecerá os requisitos para filiação de entidades sindicais, e nenhuma limitação poderá ser oposta pela central sindical à desfiliação voluntária de qualquer de suas entidades filiadas;

(4) A indicação de representantes pela central sindical de representantes nos fóruns tripartites, conselhos e colegiados de órgãos públicos será em número proporcional ao efetivo índice de sindicalização, dos sindicatos integrantes de sua estrutura organizativa, salvo acordo entre centrais sindicais;

(5) A aferição dos requisitos de representatividade de que trata o art. 2º será realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, ouvidas as entidades sindicais de âmbito nacional mais representativas de trabalhadores e de empregadores; e

(6) a contribuição sindical será para os empregadores: a) 15% (quinze por cento) para confederação, b) 10% (dez por cento) para a Conta Especial Emprego e Salário

Edésio Passos é advogado, membro do IAB, da ABRAT e do corpo técnico do DIAP, deputado federal na Legislatura 91/94 (PT/PR). E-mail:Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.