O jornal Valor Econômico desta terça-feira informa que as pressões sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva aumentaram na véspera de sua participação no encontro anual do G-8, grupo das maiores economias e espécie de diretório econômico do planeta, refletindo a dificuldade da tarefa de propagar o etanol depois da virada na imagem do combustível.
O G-8 discute hoje o impacto do carburante verde na alta dos preços de alimentos. Indagado sobre o que esperava do Brasil, opresidente da Comissão Européia, José Durão Barroso, retrucou: "A UE defende que deve haver uso de bioetanol desde que não seja feito em substituição à produção agrícola e não destrua a floresta. Daí é importante que o Brasil e Lula dêem garantias de sustentabilidade do biocombustível".
Acrescentou que o "Brasil tem sido o campeão mundial na questão do biocombustível e a única forma de conseguir progresso nisso é precisamente com posição também mais ambiciosa na mudança climática, com comprometimentos concretos".
Para Barroso, a posição do presidente Lula sobre o clima na reunião com o G-8 será especialmente importante para influenciar o mundo em desenvolvimento. "Espero que seja um sinal importante para os países do Sul em geral", afirmou.
O encontro entre o G-8 e o G-5 (Brasil, China, Índia, África do Sul e México) ocorrerá nesta quarta-feira em meio a fortes divergências sobre o que fazer na luta contra a mudança climática, que implicará transformações gigantescas nas economias.
Pela quarta vez, José Durão Barroso representa a Comissão Européia no G-8 como membro pleno do grupo. Na prática, esse clube dos ricos tem nove membros, além dos Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Itália, Reino Unido, Canadá e Rússia.
Barroso conclamou os outros dirigentes a adotarem o compromisso "ambicioso e significativo" e a reconhecerem que os ricos devem reduzir as emissões liquidas de gases de efeito estufa em pelo menos 50% até 2050 comparado aos níveis de 1999. Mas acha que os países desenvolvidos deveriam ir além e se comprometerem com reduções entre 60% e 80% - numa posição oposta à dos Estados Unidos.
Além disso, defendeu que o G-8 consiga pelo menos um acordo de "princípio" para os industrializados cortarem emissões no médio prazo, provavelmente 2020, como reclamam as nações em desenvolvimento.
Nesse cenário, a UE quer engajar também os emergentes como Brasil, China e Índia e países em desenvolvimento em função de suas "responsabilidades comuns, mas diferenciadas e de suas capacidades respectivas".
Os europeus explicam que os "compromissos" com metas para os cortes ficam com os países ricos. E que, do lado dos emergentes como o Brasil, o que se quer é "plano de ação", por exemplo, para combater o desmatamento, desde que seja "verificável e monitorável".
Em entrevista em português, enquanto uma dezena de jornalistas japoneses gravavam tudo sem entender nada, Barroso disse que que a UE está pronta a apoiar esses países com tecnologia e financiamento, inclusive para acelerar a produção da segunda geração de biocombustíveis, que não competem com a produção de alimentos.
No debate global sobre o impacto do biocombustível, ele reiterou que não é contra e sim a favor do carburante verde porque acha que pode ser parte da resposta de energia renovável para reduzir as emissões. "Não é a solução, mas parte da solução", afirmou.
Mais tarde, uma fonte européia esclareceu que a União Européia vê exagero nas criticas envolvendo impacto de etanol na crise alimentar e que Bruxelas é "realmente" favorável ao produto sustentável.
Explicou que a garantia de etanol sustentável cobrada por Barroso ao Brasil poderia vir através de acordo bilateral, exigência de Bruxelas já revelada pelo Valor. Os europeus argumentam que isso é necessário até para tranqüilizar os investimentos no setor, de que o produto não será afetado no comércio internacional.
"O ideal seria fazer isso num acordo internacional, como na Rodada Doha, mas como vai complicar, então é passar mesmo por acordo bilateral", disse a fonte.
Um relatório do Programa das Nações para o Meio Ambiente confirma que capital-risco e capital-investimento nos biocarburantes diminuíram quase um terço nos Estados Unidos no ano passado, ficando em US$ 2,1 bilhões. Mas que o investimento no carburante verde não terminou completamente, com uma transição em direção ao Brasil, à Índia e à China.
Os europeus lembram que um ponto crucial da parceria estratégica da UE com o Brasil é na área energética, que significa basicamente etanol. Mas que Brasília precisa mostrar que o desmatamento da floresta amazônica diminui, e não o contrário, como foi anunciado justamente quando o presidente Lula se encontrava em Roma, no mês passado, durante o encontro de cúpula mundial que discutiu medidas contra a crise alimentar.
Em outro sinal do que espera Lula, o primeiro-ministro britânico Gordon Brown desembarcou no Japão preparado para pedir moratória sobre alguns biocombustíveis, que um estudo britânico acusa de contribuírem para a crise alimentar global.
O estudo faz uma distinção entre o bom e o mau etanol, alvejando visivelmente o produto dos Estados Unidos feito a partir de milho. No entanto, em meio ao debate, poucos fazem a distinção, o etanol brasileiro é também afetado e o plano brasileiro de tornar o produto uma commodity global também sofre.
G-5 quer que ricos fixem antes seus cortes de emissão
O G-5 (Brasil, China, Índia, África do Sul e México) pressiona para que os países do G-8, entre os maiores poluidores mundiais, se comprometam a metas obrigatórias de redução de emissões de gases estufa já no médio prazo, por volta de 2020. Só com isso os emergentes aceitariam planos de ação nacionais no longo prazo.
O grupo dos emergentes se reunirá hoje em Sapporo, a duas horas do banquete do G-8. Somente amanhã é que os emergentes sentam à mesa com os industrializados, quando estes já terão divulgado suas conclusões sobre o estado do planeta. Um esboço do comunicado só do G-8 empurra qualquer acordo de metas especificas de corte de emissões para a conferência do clima da ONU no ano que vem, em Copenhague.
Restará a declaração conjunta do G-8 e do G-5, que continuava inconclusiva ontem por causa da questão de compromissos de longo ou médio prazo na área climática. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou no começo da manhã de hoje e a partir do meio-dia começará a série de reuniões com dirigentes do G-5 e outros países, como Coréia do Sul.
O presidente da Comissão Européia, José Durão Barroso, insistia que os países ricos precisavam pelo menos aceitar o "princípio" de cortar emissões no médio prazo, inclusive para levar os emergentes a assumir posições ambiciosas. Para ele, a demanda do Brasil para os ricos se comprometerem com metas de médio prazo "reforça" a posição da UE, que já fixou corte de 20% das emissões até 2020.
A própria UE, porém, não consegue se entender sobre seu pacote clima-energia. Analistas dizem que, se a UE conseguir, indicará o que pode ser feito no nível internacional. A França, na presidência rotativa da UE, reconhece a dificuldade para aprovar até o fim do ano as modalidades para permitir que o bloco comunitário alcance o objetivo de 20% de energias renováveis e de reduzir em 20% as emissões de gases estufa até 2020 - mesmo a 30% em caso de acordo internacional.
Para cortar suas emissões, os países do Leste Europeu querem compensações para o grande ajustamento industrial que serão obrigados a fazer e que dizem entravar seu desenvolvimento econômico. A França acena com pacote de 50 bilhões. A Polônia considera insuficiente.
Além disso, há um confronto sobre flexibilidade para os países alcançarem a meta. Por uma opção, a Alemanha poderia financiar os meios de transporte verdes na Polônia e contabilizar as toneladas de gases estufa que foram reduzidos, e assim reduzir o ajuste em sua própria industria.
Outra divergência entre os europeus é sobre os meios para evitar o deslocamento de industriais mais poluidoras. A França defende um mecanismo de ajuste na fronteira, exigindo que os exportadores importantes para a Europa comprem autorização de emissões de CO2.
Os países desenvolvidos são responsáveis por mais de 80% das emissões globais de gases estufa. Apesar de representarem somente 13% da população mundial, emitem mais de 40% do percentual global de CO2, segundo Greenpeace. A entidade considera que o Brasil tem "apelo estratégico" na reunião do G-8 por ser também um grande emissor. E contesta o projeto brasileiro de expansão do etanol e mais energia nuclear.
(Valor Econômico, 8/7)
G8 fecha acordo para reduzir emissões pela metade até 2050
Os países que compõem o G8, grupos dos sete países mais industrializados do mundo mais a Rússia, deixaram de lado grandes divergências e anunciaram nesta terça-feira (8/7) que trabalharão na direção de uma meta de pelo menos reduzir pela metade a emissão global de gases do efeito estufa até 2050.
Os líderes dos oito países enfatizaram, no entanto, que não poderão cumprir essa meta sozinhos. Em comunicado oficial divulgado durante uma cúpula no norte do Japão, os líderes do Grupo dos Oito também concordaram em estabelecer metas intermediárias anteriores a 2050, sem, no entanto, estabelecer números.
A menção a metas intermediárias é um avanço em relação ao encontro do ano passado, realizado na Alemanha, quando o G8 concordou apenas em "considerar seriamente" uma meta para reduzir pela metade as emissões até a metade deste século.
Mas o apelo aos países que participam das negociações sobre mudança climática na Organização das Nações Unidas (ONU) para que também "considerem e adotem" as metas para 2050 satisfez os Estados Unidos, que afirmaram não poder concordar com metas obrigatórias a não ser que grandes poluidores como China e Índia também cortem suas emissões.
Dan Price, assistente do presidente George W. Bush para assuntos de economia internacional, afirmou que a declaração refletiu que "o G8 sozinho não pode lidar efetivamente com a mudança climática, não pode efetivamente atingir esta meta, mas que são necessárias contribuições de todas as grandes economias".
A União Européia e o Japão vinham pressionando para que o encontro deste ano fosse além de apenas "considerar" a meta para 2050, e Bruxelas também insistiu na necessidade de metas intermediárias.
As negociações lideradas pela ONU têm o objetivo de criar uma nova estrutura a ser adotada quando o Protocolo de Kyoto vencer em 2012. Elas devem ser concluídas em dezembro de 2009 em Copenhague. (Tabassum Zakaria E David Clarke - Reuters, O Estado de S. Paulo, 8 de julho)