As cheias do Rio Acre, que ultrapassaram em março o nível de alerta de 14 metros, passando de 15 metros e alagando vários municípios do estado, tem mobilizado a população, governos das três instâncias e lideranças regionais em busca de minimizar o sofrimento de uma população que depende dos rios até para acender o fogão e cozinhar alimentos.
O estado regido pela força na natureza amazônica também lida com as surpresas do Rio Madeira, um dos principais afluentes do Rio Amazonas, que banha o estado do mesmo nome e a Rondônia, e que é atravessado pela BR-364, unica via de ligação terrestre entre os estados do Acre e Rondônia. Em fevereiro, uma forte correnteza do Rio Madeira invadiu a estrada e acabou por interditá-la, até agora. É por essa via de ligação que, em tempos normais, chegam muitos dos alimentos básicos que a população acriana consome.
Importações do Peru pela estrada interoceânica, entrega de alimentos por avião, um parque e mais dois abrigos que não param de receber famílias desalojadas em Rio Branco, todas essas alternativas de socorro estão sendo propostas ou acionadas. Mas o Rio Acre é um velho conhecido pela instabilidade da vazão, que desafia contínua e historicamente as cidades por onde passa. Aprender a conviver com ele significa dotar as áreas vulneráveis de válvulas de escape estruturais para acomodar as cheias, sem violar a natureza selvagem do rio que nasce no Peru e, com as fortes chuvas, vai acumulando águas que isolam cidades e chegam torrenciais à capital acriana.
Segundo o coordenador da Defesa Civil do Acre, coronel Carlos Gundim, a previsão de chuva para o mês de março no estado era de 227 milímetros, mas choveu 181 milímetros em três dias, castigando a população. No município de Assis Brasil, que fica mais próximo à nascente do Rio Acre, no Peru, o nível do rio subiu cerca de cinco metros em apenas 24 horas.
Já o Rio Madeira, segundo a Agência Nacional de Águas (Ana), chegou a espantosos 19,12 metros neste sábado, ultrapassando em mais de 1 metro a marca recorde de 1997 quando subiu 17,52 metros do nível normal. Por decisão liminar da Justiça Federal, as hidrelétricas Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, estão obrigadas a prestar socorro imediato às famílias afetadas pelas cheias e a refazer seus estudos ambientais.
Alternativas e paliativos
A época das chuvas, que vai da agosto a abril, já indicava em 2013 a urgência em buscar alternativas para a segurança e o abastecimento do estado acriano em caso de grandes alagamentos, que infelizmente ocorreram. Entre 24 e 25 de setembro, a vazão do Rio Acre foi tema do seminário “Engenharia urbana: cidade e mobilidade, engenharia e arquitetura pública” realizado pela FNE e o Sindicato dos Engenheiros do Acre (Senge-AC), Foram apresentados estudos de viabilidade de diferentes tipos de obras para regularizar a vazão.
Segundo o presidente do Senge-AC, Sebastião Fonseca, foi feito um convênio do Governo do Estado do Acre com a Agência Nacional das Águas (ANA) com a participação do sindicato, para estudos das possíveis soluções de engenharia, que vão de projetos de barragens, eclusas, lagoas de captação e diferentes alternativas que a engenharia também debateu em seu seminário de setembro.
No final de fevereiro o governo federal reconheceu a situação de emergência em portaria no Diário Oficial da União e autorizou a transferência de R$ 2,2 milhões para ações de socorro, assistência às vítimas abrigadas em Rio Branco, que passou de 300 famílias naquele mês para cerca de duas mil nas últimas semanas. A Defesa Civil Estadual já registra 2.478 famílias fora de suas casas na capital e nas localidades que enfrentam situação de emergência.
Revisão de impactos no Rio Madeira
O drama levou a presidente Dilma Roussef a sobrevoar as áreas afetadas pelas cheias, no último sábado (15), além de visitar os desabrigados na capital, onde anunciou a construção de uma ponte sobre o Rio Madeira para ai ligar o Acre a Rondônia.
A Justiça Federal não poupou as hidrelétricas Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, da obrigação de atender imediatamente as necessidades básicas - como moradia, alimentação, transporte, educação e saúde - das famílias afetadas pela cheia histórica. A assistência deve ser comprovada em dez dias, sob pena de multas, segundo a liminar.
A sentença judicial exige que as hidrelétricas refaçam o estudo ambiental sobre os impactos das barragens às famílias ribeirinhas. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a Agência Nacional de Águas (Ana) e o Departamento Nacional de Infraestrutura em Transportes (Dnit), de acordo com a sentença, estão obrigados a supervisionar o novo estudo.
Até que as vias de abastecimento e reacomodação da população sejam estabelecidas, com providências e obras que levarão algum tempo para serem entregues, a situação calamitosa vai exigindo medidas imediatas para evitar que falte o essencial. A chegada do gás de cozinha ao Acre é um problema sério. O combustível doméstico chega em balsas que transportam de 100 a 450 toneladas, em viagens que duram cerca de 12 dias de Manaus até Rio Branco. Consultado pelo governo do Acre, o Peru assegurou que o reservatório da região de Madre de Diós poderia fornecer gasolina e diesel ao estado brasileiro. O governo acriano também pediu ao ministério da Agricultura para viabilizar a importação de alimentos do Peru pela Rodovia Interoceânica. Seria uma alternativa para fazer chagar alho, trigo, pimenta e hortifrutigranjeiros para atender a população.
O Ministério da Saúde enviou medicamentos e a Força Nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) auxilia os estados do Acre, Amazonas e Pará, igualmente afetados por enchentes. No caso de Rondônia o governo federal enviou fuzileiros navais, militares do Exército, da Força Nacional de Segurança, bombeiros e policiais, suporte ao transporte aéreo de mantimentos de Porto Velho para Rio Branco,, um navio-hospital com helicóptero e um navio-patrulha, 14 viaturas, dez barcos e uma ambulância.
Fonte: noticia-as_aguas_que_isolam_o_acre_desafiam_a_vontade_politica_do_pais-104529_18032014
Autor: Rita Freire, com Senge-AC, FNE e Agência Brasil