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Diante da estiagem, tem havido especulação sobre o valor da energia, no mercado de compra e venda. O custo elevado que vem sendo pago pelas empresas distribuidoras para manter o fornecimento – e o socorro em forma de empréstimos pelo governo a essas concessionárias – será repassado ao consumidor final, que deverá arcar com tarifas bem mais elevadas a partir do próximo ano. É o que aponta o engenheiro Carlos Augusto Ramos Kirchner nesta entrevista ao Engenheiro. Para ele, no mínimo, medidas emergenciais precisam ser tomadas, à racionalização do insumo junto à população, de modo a amenizar tal situação. Representante da FNE no Fórum de Defesa do Consumidor de Energia e consultor na área, Kirchner defende mudança no modelo do setor elétrico como solução.


Por que existe risco de aumentos drásticos no preço da energia elétrica?
Estamos passando por uma estiagem e os reservatórios estão baixos. Isso aumenta o risco de racionamento. Esse componente físico obriga os despachos das termelétricas, ou seja, que todas estejam funcionando. Só isso já torna a coisa mais custosa, porque se reduz a geração hidrelétrica preventivamente, uma vez que o nível do reservatório está por volta de 30%, e a térmica é mais cara. Isso é algo previsível, mas tem outro componente que está fazendo com que muita gente tire proveito da crise. Com a Medida Provisória 579, concessões a vencer foram antecipadas e prorrogadas por 30 anos a partir de dezembro de 2012, e o custo da energia baixou de algo em torno de R$ 80,00 para
R$ 20,00 o MW/h. Todavia, as geradoras podiam aderir ou não, e algumas não concordaram com isso. Além de não aceitarem as tarifas menores para prorrogar as concessões, essas empresas decidiram não participar dos leilões de energia existente realizados pelo governo para suprir a necessidade das  distribuidoras e também não ofertar para os consumidores do  mercado livre, contribuindo para a escassez de energia elétrica.

Mas essas geradoras continuaram a produzir energia.
Sim, porque o mundo físico é um e o comercial é outro. Quem determina a geração e despacho é o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A energia produzida por essas geradoras foi liquidada no mercado de curto prazo, pelo PLD (preço de liquidação das diferenças), ao qual as distribuidoras que não tinham contratada energia suficiente para suprir seus consumidores e empresas que optaram pelo mercado livre tiveram que recorrer. Essas geradoras perceberam que era melhor não vender nos leilões e aproveitar o PLD elevado, de R$ 822,83 o megawatt/hora. Esse preço é estabelecido pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), com base na térmica a diesel, que é a mais cara – R$ 1.100,00 o MW/h. Contudo, isso representa uma mínima parte do sistema elétrico brasileiro, o que faz com que o PLD tenha distorções. Diante do fracasso dos leilões, o governo passou também a aumentar o valor da chamada energia nova, pela qual normalmente se pagava R$ 100,00 o MW/h. Em 30 de abril último, colocou o preço máximo de R$ 271,00 e aumentou o prazo do contrato para cinco anos e oito meses.
 
Qual é o prejuízo estimado das distribuidoras?
Por exemplo, a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) teve prejuízo de cerca de R$ 470 milhões na distribuidora somente no mês de março de 2013, que vai ser repassado aos consumidores. Isso enquanto a geradora, do mesmo dono e controlador, teve o expressivo lucro de R$ 578 milhões no mesmo mês, que é distribuído aos acionistas. Às distribuidoras, já houve subsídios no ano passado, com financiamento federal de R$ 13 bilhões, além de empréstimo privado via CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) de R$ 11,2 bilhões. O governo fala que é suficiente até o final de 2014 e todo mundo diz o contrário, que só tapou buraco até abril. Vai ter que arrumar mais dinheiro e quem vai pagar é o consumidor. Tem grande chance de os próximos reajustes serem acima de 30%. Por exemplo, na mídia saiu que a Copel (Companhia Paranaense de Energia) vai reajustar em 30% as tarifas.
Se chover hoje, muda a situação?
Mesmo chovendo, vai levar muito tempo para recompor os reservatórios. A tendência é que vamos passar no mínimo 2015 inteiro com térmicas em operação, o que provoca PLD alto. O governo pode estar contando que, com as concessões a vencer em julho do ano que vem, a energia fique mais barata para o consumidor. E ainda com as usinas em construção; em
2015-2016 entram algumas unidades geradoras, mas essas atendem ao crescimento vegetativo do  consumo de energia.
 
Qual é o impacto disso na economia?
Pode destruir toda a competitividade do setor produtivo, porque quem aumenta muito o preço fica fora do mercado. Tem muitos consumidores livres, indústrias, que estão pagando R$ 150,00, R$ 200,00, mas o contrato termina em no máximo três anos. Na medida em que isso ocorre, não encontram mais energia para comprar e daí ficam expostos ao PLD. Outra distorção é que já há várias indústrias que têm optado em parar a fabricação, porque a energia que sobra também é liquidada no PLD, elas recebem o dobro do seu faturamento sem ter custo. Daqui a pouco pode vir a faltar insumo na construção civil, na indústria automobilística. A indústria de alumínio em sua maior parte já parou.
 
Qual é a saída?
Diante do grande quadro de distorções que o PLD provoca, há de se questionar sobre sua existência. Agora, uma mudança no modelo do setor elétrico não vai ser feita de uma hora para outra, tem que ser discutida com calma. Provisoriamente, tem que haver medidas emergenciais, baixar o preço teto do PLD, o que já reduz fantasticamente essas contas e não estimula a indústria a parar de produzir. Além disso, no mínimo, racionalização de energia desde já seria necessário. Poderia ser feita uma campanha de conscientização e incentivo junto aos consumidores.

 

Fonte: noticia-kirchner_conta_de_luz_pode_subir_mais_de_30-075504_09062014

Autor: Soraya Misleh

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